sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Artigo: Meu Deus do Céu!



Ruben Figueiró*

Uma nota pequena à margem de uma página de jornal, eis a notícia: "a dívida pública do Brasil ultrapassou 2 trilhões de reais". Meu Deus do céu!, exclamei.

Anotem: uma criança que acaba de nascer já assume sobre seus ombros uma dívida herdada de seus País superior a 1 mil reais, isto sem acrescentar os juros moratórios. Na pródiga e faustosa propaganda oficial versa que quitamos, no Governo Lula, a dívida externa. Nada obstante os dados, também oficiais, ficamos sabendo que ela está na ordem de 5% do PIB.

O Governo alega também que temos reservas de algo em torno de 300 bilhões de dólares aplicados em bônus rentáveis no exterior. Tudo bem. Esse foi um passo importante, conquistado graças à política econômica de FHC, porém não menos importante a considerar é a estratosférica dívida interna.

O chamado "superávit interno", tido como reserva estratégica para pagamento de juros referentes à dívida interna, tão louvados pelos áulicos governamentais, se mostra, contudo, insuficiente para cumprir a sua missão amortizatória.

Na tentativa de minimizar as dificuldades do Tesouro, as autoridades fiscais levantam a tese (frágil) de que a receita cresce para suportar os compromissos, a cada tempo alcançando aumentos geométricos, o que torna necessário, para fechar as contas, o aporte de recursos oriundos das instituições bancárias privadas, estas ávidas por altas taxas em razão do spread garantidor  do risco oficial.

Estas reflexões, após ler a notícia desencorajadora justamente neste final de ano, quando o clima natalino nos torna mais tolerante e de boa fé, não deixa de mexer com a cuca da gente. Como 2014 será um ano de extraordinários acontecimentos, a Copa do Mundo, as eleições presidenciais, de governadores e de renovações no Poder Legislativo, quando a tendência do oficialismo é a de não ter parcimônia nas despesas decorrentes da ambição e das exigências de um mercado eleitoral crescente no mesmo diapasão, qualquer cidadão que se preocupa com o futuro fica de cabelo em pé.

Confesso, caros leitores e leitoras, que a diminuta nota jornalística transformou-se para mim – e tenho certeza para todos aqueles que a leram – numa expectativa não otimista para o ano que abre as portas. Disseram-me que o consagrado economista André Lara Rezende publicara longo artigo extremamente alarmante em que analisa a situação econômica do País, suas perspectivas próximas com fulcro nos pífios resultados geradores de uma já sintomática crise tributária e financeira na gestão governamental, indicando que estamos sem horizontes claros que anunciem esperanças de recuperação econômica.

A esse respeito, inclusive, o Ministro Guido Mântega, em quem acredito bons propósitos, em recente manifestação afirmava que a ação das finanças públicas e a baixa performance do setor privado (este desestimulado e, portanto, precavido, diria) estão de "pernas mancas"...Como já dissera Schopenhauer:  "o homem tem, no dia, 15 minutos de bobeira", o que talvez tenha sido um desses momentos em que incorreu sua excelência. Daí nasce a nossa preocupação.

*Senador (PSDB/MS)

segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Artigo: Campanhas eleitorais - o peso do dinheiro

*Ruben Figueiró

O debate em torno das doações de campanha eleitorais pode transformar o modus operandi da política brasileira. A decisão final do STF sobre a ação da Ordem dos Advogados do Brasil para extinguir o financiamento de campanhas por empresas (o que deve ocorrer após o recesso do Judiciário) pode representar um passo importante para criar outras maneiras de se fazer campanhas no Brasil, sem o peso sufocante dos grandes conglomerados empresariais.

O fato concreto é que o atual modelo é nefasto. Os grandes escândalos de corrupção na história recente do País tiveram origem no processo deletério de financiamento de campanha.

Ao longo do tempo, o candidato deixou de fazer compromissos com os eleitores no contato direto, olho no olho, com estrutura modesta e passou a usar a lógica do marketing sofisticado, dependente de fartos recursos e imensas estruturas. O candidato passou a ser produto e sua "imagem" mais importante do que os valores que professa.

Perdemos a essência da chamada boa política, que, infelizmente, mudou muito na medida em que as grandes empresas tomaram conta do processo eleitoral.

Para se ter uma ideia, na última eleição nacional, cerca de 95% dos R$ 6 bilhões arrecadados pelos candidatos vieram de 1.900 pessoas jurídicas. Calcula-se que, para ter chances reais nas urnas, um candidato a deputado federal precisa desembolsar, em média, R$ 1 milhão. Se concorrer ao cargo de senador, o custo sobe para R$ 4,5 milhões. A governador, R$ 23 milhões. A presidente da República, R$ 300 milhões. E quanto maior o dispêndio, maior a probabilidade de êxito.

Calcula-se que para cada R$ 1 doado, a empresa terá retorno 8,5 vezes maior, sob a forma de contratos obtidos com os governos que ajudou a eleger - razão por que as empreiteiras lideram com folga as listas de financiadores agrupados por setor. O Estado de São Paulo em editorial recente chegou a ironizar, afirmando que o termo "doação" de campanha deveria ser trocado por "investimento". Constatação que nos envergonha, por ser verdadeira.

Na minha vida política nunca solicitei a empresas que contribuíssem para minhas campanhas. Sempre obtive ajuda de pessoas físicas, companheiros que acreditavam em minha luta e em meus propósitos Foi assim que fui eleito deputado estadual e federal. Sim, os tempos eram outros: a atividade política não tinha o atual vezo de "profissionalismo" de agora.

Por isso, sou favorável ao incitamento da OAB em torno da supressão das doações de empresas para as campanhas eleitorais. Concordo com a premissa de que pessoas jurídicas não votam, portanto, não podem de maneira nenhuma influir determinantemente num processo de escolha democrática. Quem vota é o cidadão.

Há também outro aspecto deste debate: o ativismo do Supremo Tribunal Federal. Sou da opinião de que o assunto é de extrema importância institucional e precisa ser resolvido. O debate está posto com reais perspectivas de mudanças. A sociedade brasileira espera reflexão, ponderação, sintonia com as aspirações sociais emanadas de um momento histórico rico e complexo, que não permite nem admite soluções fáceis.

*Ruben Figueiró é senador pelo PSDB-MS